Na leitura, mastigada, saboreada, de José Gomes Ferreira
(Dias Comuns-VI-Memória Possível), anoto trechos que
me levam a outras paragens.
A 29 de Novembro de 1968, José Gomes Ferreira comentava um artigo de José
Régio em que este se vangloriava de nunca ter adulado os jovens e se ter posto
ao serviço de partidos ou modas (vangloriava?, ou lamentava o isolamento que tal
postura lhe provocara e justificaria o "auto-epitáfio"?).
Do comentário, retiro o trecho relativo aos partidos (e lembra-se que, então,
apenas havia um partido em Portugal, resistente ao fascismo e
clandestino):
«Os partidos devem pesar
muito na liberdade, por certo... Mas não terão algumas vezes a vantagem de nos
obrigar a vencer as mesmas dificuldades dos gigantes que dançam com cadeias nos
tornozelos?»
Esta leitura lembrou outras, muito
recentes, de artigos e textos (como cartas) de Álvaro Cunhal,
sobre Cartas Intemporais do mesmo José
Régio na Seara Nova em 1939 (quase trinta
anos antes), em que Cunhal termina o primeiro artigo
escrevendo:
«Não importa o homem
isolado dos efeitos das suas acções. Para os homens que se digladiam na
encruzilhada, um homem interessa ou vale na medida em que os acompanha na dor,
na luta e na esperança.»
E, ainda a propósito de partidos - e de classe, e
de tomar partido - em carta a Abel
Salazar, de 1938:
«O camarada diz "não ter classe". Isso seria uma explicação.
Porém, eu recuso-me a aceitá-la totalmente . O camarada ama
uma classe. Compreende e sente as suas dores e as suas insatisfações. A
sua atitude na vida é já uma posição tomada em relação aos combates que hoje -
como sempre - se travam no mundo, combates de classes, afinal.
Apenas é necessário conhecer
ainda de mais perto as grandes riquezas de sentimentos e a grande força criadora
das camadas oprimidas, e ainda a beleza da energia e da luta. É
necessária uma integração na classe a que se pertence, ou que se ama.
(...)».
Além da convergência que leituras distantes (no
tempo de escrita) suscita e se releva, há também que sublinhar que assinalar o
centenário de Álvaro Cunhal é lê-lo, relê-lo, aprender com a sua vida, o seu
pensamento, a sua luta. Que continua.
(também no blog
anónimo do século xxi)
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