O que lhes vem à cabeça quando
pensam em Cunhal?
Jornal i
Melissa Lopes (texto) e Artur Borges (fotos) 13/06/2015
19:57:00
No dia em que se assinalam dez anos
da morte de Álvaro Cunhal, fomos para a rua perceber que imagens guardam os
portugueses do líder comunista.
Lançámos um primeiro desafio,
reconhecer Cunhal em duas fotografias: uma da sua juventude, outra mais
recente. Tido por muitos como o melhor político de sempre, Álvaro Cunhal é
reconhecido pela fisionomia do seu rosto e pela coerência política que manteve
ao longo da vida. Qualquer semelhança física com Salazar será pura coincidência
de um estilo muito próprio daquele tempo.
Lúcia
Ferraz, 68 anos
Não foi preciso mostrar a fotografia
mais recente. “Será Salazar? Não, não. É
Álvaro Cunhal, não é?”. Pensava alto. Quando lhe mostrámos o segundo retrato,
Lúcia, que tinha algumas reticências iniciais, ficou cheia de certezas. “Ah,
sim. Vendo bem, Salazar não podia ser por causa do nariz e das sobrancelhas”,
diz, apontando detalhadamente para os traços característicos. “Era um homem
muito bonito. Sempre fui fã da obra dele.”
Joaquim
Arsénio, 60 anos
“É uma pena ter morrido, revejo-me
totalmente na política dele”. Joaquim fala com uma certa nostalgia do tempo do
comunismo de Cunhal: “As coisas mudaram e o partido já não é o que era. As
pessoas foram morrendo, a União Soviética desapareceu”. E um desencantamento
face à política de hoje: “Mas digo-lhe uma coisa, se as pessoas parassem para
pensar, votariam no PCP. Mas têm memória curta”, lamenta.
Rui Ramos, 55 anos
“Era um homem forte e lutador, tinha
persistência no seu pensamento. Associo-o à liberdade que temos hoje. Tinha uma
maneira de ser levado a sério que hoje os políticos não têm”, opina. Mas acima
de tudo, aquilo que Rui sente é respeito pela figura que Cunhal foi, pela
maneira como fez política de forma sempre coerente com ele próprio e com os
ideais que defendeu ao longo da sua vida, apesar das adversidades.
Carolina
Ribeiro, 19 anos
“Foi um preso político do antigo
regime e por isso associo-o ao 25 de Abril. Esteve preso em Peniche. Sei disso
porque até fui visitar a prisão”, diz Carolina. Essa é a primeira coisa que lhe
vem à cabeça. “Sei também que desenhava bem e que pintava quadros. Mas não sei
muito mais. Nas aulas de História não demos muito sobre Cunhal. Na nossa
geração, só quem é autodidata é que poderá saber mais sobre o que fez e quem
foi Cunhal”.
José
Saraiva, 70 anos
“Era um homem lutador, um
‘pugilista’ apesar de ser magro. Foi um dos melhores ativistas portugueses. Deu
a cara pela liberdade sem medo de morrer”, recorda. José, que está desencantado
com a política, considera Cunhal “um dos maiores políticos que Portugal já
teve”. Recorda o tempo dos comícios na sua empresa, em 1975-1976, onde
Cunhal discursava. “Agora a melhor profissão para se ter é a de corrupto”,
ironiza.
Sara Boto,
16 anos
Sara não reconheceu nenhuma das
fotografias, nem sabe dizer quem foi Cunhal. Tem uma boa justificação: quando o
antigo dirigente do PCP morreu, Sara tinha só seis anos. Mas a mãe, Ana
Margarida, de 53 anos, elucida-a: “Foi um dos políticos mais importantes antes
do 25 de Abril. Lembro-me dos debates acesos que fazia. Antes os políticos
agiam pela necessidade de intervir, agora é para se servirem a si próprios”
Isa Santos,
39 anos
Poderíamos interferir no primeiro
pensamento que Isa teve sobre Cunhal para não ter palavras repetidas? Podíamos,
mas não era a mesma coisa. Isa pensou duas e três vezes, a única que servia era
mesmo “Liberdade”. Para a contabilista, Álvaro Cunhal foi um político que
passou uma vida inteira a lutar pelos direitos do povo e dos trabalhadores. Mas
não só: “escreveu vários livros e recentemente até saíram uns cartoons dele”,
lembra.
Miguel dos
Anjos, 56 anos
Para Miguel, Cunhal era austero, mas
no sentido virtuoso. “Ser austero na vida, na relação com os outros, não
significa privar os outros de nada”, esclarece. “Cunhal era austero porque
impunha limites naquilo que é o poder, e noutras dimensões da vida. Era um
homem sério, sensato, culto, não foi um oportunista. Não sei se foi o maior
político de Portugal, mas duvido que o próprio PCPconsiga atingir níveis de
coerência que Cunhal exemplificou.”
... e continua VIVO!
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